Toda vez que passo por cajazeiras sempre fico na pensão de seu Eliseu, e como sempre, lá sou muito bem acolhido, Dona Ana, mulher dele é como se fosse uma mãe pra mim, considero bastante essa velhinha sofrida com as mãos calejadas da enxada e da foice com as quais da terra tirava o seu sustento, mulher batalhadora, guerreira. Aposto que minha mãe também foi uma grande mulher, lamento muito ela não ter vivido pra me ver crescer, tenho certeza que ela me amaria muito e eu muito mais a amaria.
Visito alguns lugares, vendo minhas coisinhas e à tardinha vou à bodega de se Nilo, por lá tomo um aguardente, palestro um pouco com os companheiros. Derrepente adentra um moleque todo maltrapilho, os olhos rasos d’água, pernas e braços finos como cipós, e se dirigi aos clientes sacudindo uma caneca com poucas moedas a trilintar dentro da caneca. Ele lança um olhar tão sofrido para as pessoas, enquanto algumas simplesmente o ignoram, alguns espantam o moleque, outros dão dinheiro, mas mal encaram o garoto, pelo menos pra tentar sentir um pouco do sofrimento do pobre.
Ao ver tal cena me sinto estranho, acanhado, derrepente sinto uma vontade imensa de chorar, um aperto no peito como se o meu coração fosse se diminuindo. É como se o menino fosse eu.
O menino para em pé e come com voracidade um pedaço de pão seco, dado por seu Nilo, ele me encara, eu o olho meio destreinado, seus olhos ainda rasos d’água, percorrem todo o ambiente, mas sempre estancam na minha pessoa, o menino mira bem fundo em meus olhos e parece que o seu sofrimento é transportado pra mim, através de seus olhos. Ai é que meu corpo é possuído por uma sensação de desprezo, e uma lagrima passeia pela minha face.
O menino se dirigiu até mim, olha mais fundo e internamente, eu também o encaro, e como um sussurro da sua boca sai tal frase: Um trocado sinhô.
Fico todo desconcertado, e tiro da minha valise um tostão, e o entrego fazendo uma cara de quem queria conformá-lo. Tudo isso só para vê-lo sorri pra eu não chorar.
E o menino agradece todo educado, e dali sai para mais uma tomada do filme da vida.
Sinto-me feliz em ter ajudado, mesmo sendo de tal forma. Dou um suspiro profundo, como de alivio, tomo o pouco de aguardente que restava no copo, aprumo o chapéu na cabeça e sigo para a pensão de seu Eliseu.
O meu dia termina com mais uma mostra de como a vida é, nua e crua, doa a quem doer.
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| Rafael Bezerra, 1º ano - Tarde |
| 23/09/2010 |
| 22:40 hs |
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